A obra de Verger: um inventário
Os livros de fotografia representam a primeira fase de sua obra, que compreende os anos 1932 a 1951-52 e retrata as mais diversas culturas, que ele conheceu em suas diversas viagens. Estas obras fotográficas foram publicados em muitos países. Às vezes Verger participava de livros coletivos, abordando assuntos como Espanha, Itália, China, Japão, Brasil [24] , junto com outros fotógrafos, como também publicou livros com fotos exclusivamente dele, como South Sea Islands (Londres, 1937), Méxique (Paris, 1938), Vietnam (Paris, 1951), Congo-Belga (Paris, 1952) e Bahia de tous les poètes (Lausanne, 1955). Muitos destes livros da fase inicial foram publicados pelo editor e amigo Paul Hartmann, em Paris, uma pessoa chave no mercado editorial parisiense da época. Sobre os índios no Peru foram publicados Fiestas y Dansas en el Cuzco y en los Andes (Buenos Aires, 1945) [25] , Indians of Peru (Chicago, 1950) e mais tarde Indiens pas morts (Paris, 1956), no último novamente em colaboração com mais dois outros fotógrafos. No Brasil sua obra fotográfica só é publicada a partir dos anos 80, embora já tivessem existido alguns projetos de publicação anteriormente que por diversos motivos desconhecidos não foram realizados. [26]
Desta primeira fase, em que fotografava mas não escrevia, vale ressaltar alguns dos trabalhos nos quais Verger colaborou: durante o tempo em que trabalhou para a revista O Cruzeiro [27] , foram realizadas uma série de reportagens propostas por Verger sobre a presença da cultura brasileira na Nigeria e no Benin, tendo Gilberto Freyre como autor dos textos. As cinco reportagens “Acontece que são baianos” foram publicadas em agosto de 1951 e mais tarde republicados por Freyre em forma de um capítulo de Problemas brasileiros de antropologia [28] e ainda em Bahia e Bahianos, [29] nos dois casos infelizmente sem colocar as fotografias originais. Nos textos publicados em livro, Freyre coloca uma introdução, inexistente nos artigos originais em O Cruzeiro, reconhecendo a importância de Verger e sua iniciativa para a realização deste trabalho, pois a idéia inicial, e praticamente todas as informações colhidas em pesquisa foram deste último, como se pode ler na correspondência entre os dois. [30] Uma parte do material levantado por Verger trata das tradições musicais dos brasileiros voltados para o Benin: Verger teve muito contato com o chefe da associação dos brasileiros, Casimiro de Almeida, descendente de brasileiros, em Uidá, onde existe até hoje a tradição do Bumba-meu-boi. [31] Nas correspondências de Verger encontram-se cartas de 1992 de descendentes do mesmo grupo pesquisado por Verger nas quais se fala do mesmo repertório utilizado até hoje. Só dois pequenos textos de Verger abordam mais tarde a questão das letras do repertório musical deste grupo de descendentes de brasileiros no Benin. Trata-se de “L’influence du Brèsil au Golfe du Benin” (Dakar, 1953) e “América Latina en Africa” (Paris, 1984). [32]
A publicação dos artigos em O Cruzeiro teve como complementação indireta uma gravação com cantigas que Verger coletou de duas velhas senhoras, que retornaram para África quando adolescentes. Esta gravação do início dos anos 50, até hoje inédita, foi realizada com a ajuda de seu amigo etnomusicólogo Gilbert Rouget, amigo e companheiro de muitas pesquisas realizadas na África. Diz Gilberto Freyre a respeito:
As palavras que ele soube recolher, em moderníssimo aparelho de gravação, de duas brasileiras, de origem africana, há muitos anos separadas da Bahia e fixadas na África, não são apenas um documento de interesse científico: são também poesia como que dirigida. <.....> Monsieur Gilbert Rouget, do Museu do Homem de Paris auxiliou Pierre Verger na gravação desse documentário rico de sugestões. Ao técnico em gravação devemos também agradecimentos. Mas é esse novo aspecto do trabalho de Pierre Verger – o de gravar na África vozes de afrobrasileiros que as culturas maternas não tem conseguido absorver senão em parte – que principalmente merece dos pesquisadores interessados nas origens africanas da cultura nacional do Brasil, uma particularíssima atenção. É um trabalho o de Monsieur em torno de assuntos afrobrasileiros, que continua a se fazer notar pelo seu vivo empenho de documentação desses assuntos, através de técnicas as mais modernas e de pesquisa de campo as mais difíceis. Um trabalho deveras admirável. [33]
Deste contato direto com Gilbert Rouget, resultou o interesse que Verger desenvolveu pela música, embora sempre ressaltasse que era apenas um leigo. Foi Rouget quem deixou em 1952 um gravador na mão de Verger, que a partir desta data começou a usar este recurso indispensável, tanto para gravar música, quanto para gravar um rico acervo de literatura oral. [34] As duas Senhoras, Maria dos Anjos Ojelabi e Maria Romana da Conceição, foram gravadas ainda diversas outras vezes, após que Verger veiculou a primeira gravação pela Rádio Ministério da Educação no Rio, na Bahia e em Pernambuco. [35]
Nesse contexto precisa ser mencionada uma outra pesquisa fotográfica, provavelmente a última que tematicamente deu continuidade àquela iniciada para a publicação com Freyre, embora fosse realizada quase trinta anos após àquela. Ela foi encomendada pelos amigos Manuela e Marianno Carneiro da Cunha e realizada durante a estadia dos três na Nigéria, Marianno como professor visitante na Universidade de Ifé (1975-76) e Verger, em seguida, na mesma função (1976-79). O resultado da pesquisa, na forma de um ensaio fotográfico, faz parte do livro Da Senzala ao sobrado, de Marianno Carneiro da Cunha. [36] As fotos são parte indispensável para a visualização dos aspectos arquitetônicos brasileiros presentes na Nigéria analisados no texto. O resultado desta pesquisa foi, além do mencionado livro, uma exposição que percorreu diversas cidades do Brasil, em 1978, como São Paulo e Salvador, onde se realizou na Faculdade de Arquitetura da UFBA.
As publicações com textos de Verger aparecem apenas após dele ter publicado um grande número de livros com fotografias e reportagens diversas, embora existissem também diversas anotações desta época em forma de pequenos textos, até hoje nunca publicados, que retratam especialmente as suas viagens pela Indochina. A partir de 1946 ele começa a concentrar os seus estudos e sua vivência na cultura iorubá nos dois lados do Atlântico, passando aos poucos do fotógrafo para o escritor, antropólogo e historiador que em 1951 ressalta numa carta dirigida a Métraux que começou a fixar as suas observações por escrito. “Inacreditável, mas verdade!!! Comecei a redigir algumas das minhas anotações, ... e como é desamarrar que é o mais penoso; ... eu penso que continuarei ... este calvário.” [37] Verger sempre ressaltava que ele nunca teria começado a escrever, sem a “imposição” e exigência de Theodor Monod de escrever e publicar, depois de lhe ter oferecido a primeira bolsa, sem que ele tivesse imaginado que teria de escrever sobre a sua pesquisa. Para ele as fotos entregues ao IFAN seriam suficientes para quitar suas obrigações. Esta segunda fase se estende por cerca de 30 anos, durante os quais ele continua vivendo alternadamente nos dois lados do Atlântico, embora comece a fortalecer sempre mais as suas raízes plantadas na Bahia. Em 1979 encerra-se a sua última estada na Nigéria (como professor visitante na Universidade de Ifé, onde ele já tinha passado diversas vezes nos anos 50 e 60) e a partir deste momento decide trabalhar na Bahia, onde começa a publicar os seus primeiros livros no Brasil e dedicar-se à finalização de outras pesquisas ainda em curso.
Podemos observar que Verger trabalhou durante décadas a questão das ligações históricas entre os dois lados do Atlântico, com todas as suas implicações econômicas, políticas, históricas, religiosas e humanas. A partir do momento em que ele descobre a correspondência comercial de Tibúrcio dos Santos, o chamado ‘Alfaiate’, em Uidá em 1949, ele começou a publicar diversos textos sobre esta questão. O primeiro é a própria correspondência “Cartas de um Brasileiro estabelecido no século XIX na Costa dos Escravos” (São Paulo, 1952), com uma análise do conteúdo das cartas que se referem ao período do tráfico clandestino. A mesma temática é abordada em “L’influence du Brésil au Golfe du Benin”, Mémoire no 27 do IFAN, (Dakar 1953), embora se trate basicamente de uma compilação de textos dos mais diversos autores a respeito desta questão, incluindo as mencionadas cartas (na tradução para o francês), sendo acompanhado também por diversas fotos que mostram a influência brasileira. É importante ressaltar que o volume todo, com a participação dos colegas mais importantes da época, foi organizado por Verger, a convite de Theodor Monod. Entre os autores incluídos no volume encontram-se Roger Bastide, Edison Carneiro, Gilberto Freyre, Joseph Greenberg, Melville Herskovits, Carlos Ott, Donald Pierson, Willam Bascom, Lydia Cabrera, Michel Leiris, Alfred Métraux e Ruth Landes, além de diversos outros colegas, na maioria todos amigos que dividiram com Verger o interesse por uma temática comum.
Estes dois mencionados textos de Verger, como diversos outros, preparam na verdade a sua grande obra, Fluxo e Refluxo, publicada primeiramente na França, em 1968, e como Trade relations between the Bight of Benin and Bahia from the 17th to 19th Century em Ibadan em 1976. Só em 1987 saiu em português. Entre estes textos preparatórios tem: “Notes on some documents in which Lagos is referred” (Ibadan, 1959), onde ele analisa fontes a partir do final do século XVIII, analisando as relações de Lagos (ou Onim) com o Brasil. “Les cotes d’Afrique occidentale entre ‘Rio Volta’ et ‘Rio Lagos’. 1535-1773” (Paris, 1968) aborda as questões levantadas em Fluxo e Refluxo, porém trabalha basicamente com mapas antigos. Alguns textos, publicados em 1965 e 1966 pela revista Études Dahomeenes, em três números diferentes, também tratam da história dos fortes ao longo da costa africana, como “Le Fort St. Jean Baptista d’Ajuda” ou “ Le fort portugais de Ouidah” que mais tarde serão transformados num capítulo de Fluxo e Refluxo. Outros textos que deveríamos colocar neste grupo são “Retour des ‘Bresiliens’ au Golfe du Benin au XIX siècle” (Porto Novo, 1966), que seria um esboço do futuro capítulo XVI do livro, e o texto “Rôle joué par le tabac de Bahia dans la traite des esclaves au Golfe du Benin”, publicado em 1963 em Paris e em 1968 em português. Este último texto aborda a curiosa importância que o tabaco de terceira qualidade tinha para as relações comerciais diretas entre a Bahia e o Golfo do Benin. Todos os textos que abordam aspectos históricos são o resultado de inúmeras pesquisas nos arquivos da Bahia, Rio de Janeiro, Paris, Lisboa, Londres, Haia e mais tarde Lagos. [38] Alguns capítulos de Fluxo e Refluxo são desmembrados depois de sua publicação, provavelmente para facilitar uma maior circulação. Como exemplo pode ser citado a edição do último capítulo “Formação de uma sociedade brasileira no golfo do Benin no séc. XIX” em três línguas - portugûes, francês e espanhol (Dakar, 1969) -, muito antes da tradução para o português; ou então “L’esclavage a Bahia au XIX siècle” (Paris, 1968), constituindo um resumo de dois capítulos de Flux e Reflux. “Relations commerciales et culturelles entre le Brésil et le Golfe du Bénin” (Paris, 1969), foi baseado em Fluxo, embora não seja um capítulo do livro. Chama atenção que existem diversos textos que – além da discussão das relações mais comerciais - ressaltam as condições de vida de escravos libertos e repatriados em diversos países da África, como “Repatriates from Brazil and Sierra Leone to the Bight of Benin in the XIXth century”, conferência em Ibadan em 1965 [39] , e “Retour des Brésiliens au Golfe du Benin au XIXe siècle”, publicado em 1966, que pode ser descrito como antecipação do último capítulo de Fluxo e Refluxo. O texto “Les nouveaux Brésiliens dans le golfe du Bénin: un métissage culturel et biologique” (Cotonu, 1983), faz uma abordagem bem ampla e geral de todos os aspectos tratados em diversas publicações anteriores, embora não tenha ligação direta com nenhum deles. Para explicar o retorno dos escravos brasileiros à Africa, Verger passa por uma abordagem da situação local na Bahia, incluindo as sociedades de alforria, das relações comerciais transatlânticas, da influência da cultura negra no Brasil, com as suas tendências de integração ou de revolta [40] , para analisar no final a situação dos descendentes de brasileiros no Golfo do Benin, incluindo a situação em Sierra Leone.
Uma publicação curiosa é o texto “Jean-Baptiste Douville, naturaliste calomnié ou impostor démasqué?” (Salvador, 1976), publicado em francês na revista Afro-Ásia. Até hoje não existe unanimidade se Douville foi de fato um viajante naturalista ou um impostor. Além de uma viagem ao Congo, passou um tempo na Argentina e finalizou a sua vida entre os índios no sul da Bahia, entre 1833 e 1835, onde foi assassinado. É interessante que foi um dos melhores amigos de Verger, Alfred Métraux, quem chegou a editar e publicar uma parte das anotações de Douville, referente a viagem pelo Brasil, em 1929, em Tucuman, na Argentina. [41] Parece ser um texto muito pouco conhecido e o próprio Verger não o conhecia quando publicou o seu, baseando-se no texto original de Douville, arquivado em Paris. Verger tomou conhecimento do texto de Métraux apenas no início dos anos 90.
Existem ainda diversas outras publicações que abordam as relações mútuas entre África e o Novo Mundo, como “Yoruba influence in Brazil”, na revista Odu, (Ibadan, 1955), “Nigeria, Cuba and Brazil”, Nigeria Magazin, (Lagos, 1962) e “African Cultural Survivals in the New World: The Examples of Brazil and Cuba” (Lagos, 1978), “America Latina en Africa” (Madri, 1977), “El Brasil Africano” (Madri, 1985) e “Métissage au Brésil” (Montreal, 1993), textos curtos nos quais ele apresenta, especialmente ao público africano, a existência de semelhanças e paralelos da África com o Novo Mundo, fazendo ainda uma comparação entre Brasil e Cuba. Alguns destes textos trazem fotos como exemplos. Esta mesma temática é abordada em inúmeras palestras e conferências, além de diversas exposições fotográficas. Neste caso vemos novamente a grande importância de Verger como mensageiro entre a África e o Brasil. [42]
A ligação histórica entre os dois continentes nos dá a possibilidade de abordar um dos outros aspectos temáticos trabalhado por Verger, referente à arte africana e em especial ao culto dos voduns: “Le culte des Voduns d’Abomey aurait-il été apporté à Saint Louis de Maranhão par la mère du roi Ghezo?” (Porto Novo, 1952) e mais tarde “Échange de cadeaux entre rois d’Abomey” (Dakar, 1970), e finalmente “Uma Rainha Africana em São Luís” (São Paulo, 1990). Todos três textos abordam a história dos voduns em São Luís do Maranhão e sua relação com a família real do Benin, envolvendo a história da rainha exilada Na Agontimé e a curiosa presença do trono de um rei africano e de uma bandeira própria da corte daomeana no acervo do Museu Nacional no Rio de Janeiro. Enquanto o primeiro texto ainda é um levantamento inicial da questão, baseado nas primeiras pesquisas orais de Verger em São Luís do Maranhão (1948) e no Daomé (em 1936 e desde 1948), o segundo já envolve pesquisas em arquivo e acervos museológicos, além de começar a utilizar a documentação fotográfica para a comprovação de seus argumentos. Mesmo assim, comparando o segundo ao terceiro, podemos dizer que o segundo aborda detalhes da troca de presentes entre soberanos que vão além da história do trono real, enquanto o terceiro fecha realmente a questão, mostrando todas as informações até então pesquisadas por Verger. Especialmente o último texto está acompanhado por uma documentação fotográfica bem completa. [43] A pesquisa em torno da história do trono real mostra de forma muito plástica como Verger conseguia ligar nas suas pesquisas questões históricas, artísticas e humanas, pois o ponto de partida para toda pesquisa foi a pesquisa de campo com o levantamento de dados, oriundos da transmissão oral e relativo à documentação fotográfica. O texto “African art outside Africa” (Dakar, 1966), bilingüe, traz algumas informações curtas a respeito de manifestações artísticas no Novo Mundo que podem ser enquadradas numa descendência africana. Ainda tem a publicação referente à reestruturação do Museu Histórico em Uidá, realizada por Verger, junto com Clemente da Cruz (1969), resultando em um pequeno guia do museu criado pelos dois, dentro de um dos famosos fortes no litoral da costa africana, tão importantes para a sua história e diversas vezes abordados por Verger nas publicações já mencionadas. Mais tarde, a partir de 1976, ajudou também na realização de um intercâmbio cultural, incluindo troca de peças entre o Museu de Arte e Arqueologia da Universidade de São Paulo e o Museu de Dakar, como no final dos anos 50, em 1959, já tinha trabalhado para o Museu de Lagos, Nigerian Museums. Ainda existe um pequeno texto de Verger “África Negra” (São Paulo, 1988) para acompanhar a exposição homônima África Negra em 1988, realizada pelo MASP em São Paulo, onde Verger aborda as peças africanas expostas.
Poucos pessoas se lembram que Verger teve uma participação fundamental na criação e instalação do Museu Afro-Brasileiro em Salvador. Ele tinha sido encarregado pelo CEAO, a pedido e com verbas do Itamaraty, de adquirir as peças para este museu na África. Com esta finalidade Verger foi contratado pela UFBa em 1974, a partir daquele momento fazendo parte de seu quadro. Durante o ano de 1975 Verger comprou as peças, em grande parte encomendadas de artesãos africanos, viabilizando também trocas e empréstimos com outros museus. Após uma estadia de quase três anos de 1976 a 1979 em Ifé como professor visitante, voltou à Bahia, preparando as legendas e os textos a serem expostos conjuntamente com as peças e fotos suas, que foram incluídas no acervo. A inauguração do primeiro módulo do museu aconteceu em 1982, representando apenas a primeira etapa de um projeto mais amplo e ambicioso.
Pode parecer curioso que Verger não publicasse mais sobre arte africana, pois seu acervo fotográfico possui um número grande de fotografias que documentam objetos e obras de arte, na África e no Brasil, incluindo acervos de museus como o do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e do Museu Estácio de Lima. [44] Ainda tem material fotográfico a respeito da obra de pintores baianos famosos [45] na época de 1940/1950, e da arte sacra de diversas igrejas, como Ordem Terceira de São Francisco, Carmo, Catedral Basílica, São Bento, Boqueirão, Conceição da Praia, Bonfim, Boa Morte. Porém, devemos entender especialmente o seu interesse pela arte africana num contexto maior, uma expressão cultural das pessoas, e como tal tinha a sua função contextual, indispensável para a sua compreensão. Quando ele ficou junto com diversos outros colegas como Wande Abimbola, Olabiyi Yai, Ulli Beier, Wilfried Feuser e Adeagbo Akingjobin nas recém- criadas universidades nigerianas, logo após da independência, nos anos 50, não era muito comum nos meios acadêmicos considerar a arte e cultura africanas como tais. Ao contrário, predominava ainda o conceito de cultura e arte primitivas. Neste contexto, é criado o Extra- Mural Department da Universidade de Ifé [46] com uma visão muito mais iorubana, voltada para a cultura local. Surge um movimento de valorização da cultura iorubá, do qual Verger, com todas as suas pesquisas, faz parte. Mais tarde, nos anos em que Verger esteve como professor visitante em Ifé, entre 1976 e 1979, ele foi uma das principais cabeças na elaboração de um manifesto, publicado no campus de Ife, reivindicando a presença de um local de culto para as religiões tradicionais nigerianas. Dentro de uma pretendida visão ecumênica, faltava justamente esta religião, apesar de todas as outras estarem presentes. Este manifesto foi publicado em 1977, e além de Verger também assinaram Wole Soyinka, Wande Abimbola, Abdias do Nascimento e outros.
Neste contexto, ligado à arte, ocorre a sua maior decepção em relação à Nigéria. No momento da viagem de volta ao Brasil, em 1979, ele fica preso sob a alegação, entre algumas outras incabíveis, de estar envolvido no roubo da cabeça original de Olokum, descrita por Frobenius em 1910. Este bronze original de Ifé até hoje está perdido, enquanto encontra-se uma provável cópia desta cabeça no British Museum, em Londres. A cabeça vista na casa de seu amigo Carybé na Bahia - conforma a acusação, supostamente a cabeça original de Olokun - foi levada para a Nigeria para ser “devolvida” à nação nigeriana. Porém, ao ser identificada lá, foi constatado que a peça da casa de Carybé nunca foi mais do que uma réplica em gesso daquele bronze exposto em Londres, onde a réplica fora comprada. [47] O mais doloroso desta acusação, obviamente injusta, foi que envolveu colegas e até amigos de Verger, que por causa de um nacionalismo mal entendido ultrapassaram os limites do bom senso e da objetividade, causando a prisão de Verger que já beirava os seus 80 anos.
Um outro grupo de publicações importantes são as que abordam a questão das religiões africanas e afro-brasileiras começam a surgir nos anos 50, embora ainda timidamente, como em “Une sortie de ‘iyawo’ dans un village nago au Dahomey” (Porto Novo, 1951), descrevendo o ritual de iniciação de uma jovem para Ogum com fotos e muitas letras de cantigas em iorubá e francês. “Un rite expiatoire: Oma” (Dakar, 1953), escrito junto com Alexandre Adandé, [48] é baseado em notas de campo de 1949, descrevendo um ritual expiatório que ocorre sempre quando há uma profanação ou algum sacrilégio contra ou em relação a uma pessoa iniciada ou uma entidade. Traz diversas letras em fon e francês. Só em 1954 é publicado o seu primeiro grande clássico, Dieux d’Afrique, que traz basicamente fotografias e uma resumida descrição do contexto ritual e de cada orixá. [49] Três anos mais tarde sai Notes sur les cultes des orisha et vodoun, à Bahia, la Baie de tous les Saints au Brésil, et l à l’ancienne côte des esclaves. Trata-se de um livro monumental, descrito por Monot no prefácio como obra em que Verger apresenta uma enorme quantidade de material, reunindo pedra por pedra, não com a intenção de fazer uma obra sistemática e cientificamente organizada, mas sim trazer ao público o enorme acervo coletado durante as suas pesquisas exaustivas, a partir das quais futuramente alguém, se quisesse, poderia construir um edifício inteiro. [50] Esta obra traz, além das suas próprias observações e descrições, também uma vastíssima compilação dos mais diversos autores que já escreveram sobre o assunto. A parte mais importante deste livro, que foi o resultado das suas pesquisas entre 1949 e 1953 e de sua reclusão de 18 meses na Ilha de Gorée com a finalidade de escrevê-lo, são sem dúvida os inúmeros orikis de todos os orixás ali reproduzidos. Este livro é um marco na história das religiões africanas e afro-brasileiras, pelo fato de apresentar esse corpus da literatura oral iorubá. As fotos de Notes são as mesmas de Dieux. É interessante ressaltar que nestes dois livros encontram-se também fotos coloridas, depois desta data pouco usadas por Verger. Ele usou filmes coloridos certamente a pedido da revista O Cruzeiro, nos anos 1954-1957. [51]
Há diversos outros textos sobre religiões africanas e afro-brasileiras, muitos deles originalmente apresentados em congressos e colóquios. [52] Uma comparação entre nomes de divindades brasileiras e africanas é feita em “Lista das divindades africanas no Brasil e no seu lugar de origem” (UNESCO, 1985), que – como o título já diz – é uma compilação dos diversos nomes e tipos de orixás que Verger encontrou durante as suas pesquisas, e a sua contextualização. A temática dos orixás acompanha Verger há mais tempo, sendo abordada em Orixás (Salvador, 1951), uma pequena publicação com desenhos de Carybé e um texto curto com uma descrição resumida de cada orixá. Sobre o mesmo assunto Verger escreveu também para enciclopédias e dicionários porque ele viu como uma de suas tarefas fazer com que a religião dos orixás se tornasse mais conhecida e respeitada, falando e escrevendo nas mais diversas linguagens e extensões sobre este assunto. Por este motivo há diversos textos menores que abordam esta questão - do texto mais acadêmico até o mais jornalístico. Como exemplo podemos citar: “Orixá”, texto publicado na Enciclopédia Mirador (São Paulo, 1974), incluindo 21 fotos; e “Yoruba. Mythes et religion et leurs prolongements afro-americains”, no Dicionnaire des Mythologies (Paris, 1981), com 11 fotos. Os dois textos abordam resumidamente uma temática que ele trabalhou de forma mais extensa em Orixás. De certa forma estas publicações tiveram continuação na Iconografia (Salvador, 1980) de Carybé, onde também há um texto de Verger, que é praticamente idêntico ao do livro Orixás, os deuses iorubás na África e no Novo Mundo publicado em 1981, um dos livros que mais o tornou conhecido aqui no Brasil. Um assunto não abordado em Orixás é a questão do bori, ritual preliminar, descrito por Verger em “Boori, primeira cerimônia de iniciação ao culto dos orisa nagô na Bahia” (São Paulo, 1981). Ele é interessante por causa dos diversos desenhos gráficos e dos textos ali reproduzidos, cantados durante a cerimônia, que ilustram os acontecimentos descritos durante a cerimônia. Foi originalmente publicado em 1955, com uma introdução de Roger Bastide, e também aproveitado em Notes sur les cultes des orixás.
Quanto às religiões afro-brasileiras diversos textos que falam sobre o Brasil foram publicados e apresentados na África. Em “Raisons de la survie des religions africaines au Brésil” (Paris, 1972) Verger dá, através de uma abordagem histórica, as razões para a existência, sobrevivência e força das religiões afro-brasileiras no Brasil, incluindo todas as nações. Uma abordagem interessante e pouco comum no seu ponto de partida é o texto “Les religions traditionelles africaines, sont-elles compatibles avec les formes actuelles de l’existence?” (Paris, 1965), apresentado no encontro de Bouaké, organizado por ordens religiosas interessadas em compreender melhor as religiões tradicionais da África. Frente a este pano de fundo Verger faz uma análise geral da situação das religiões africanas e dos conceitos normalmente usados para descrevê-las. [53] Em “African Religions and the valorisation of the Brazilians of African Descendent” (Ifé, 1976-77) Verger faz uma introdução geral da história das relações Brasil–África e discute as conseqüências para a cultura e religião de origem africana no Brasil, mostrando desta forma para o leitor africano o que tinha de semelhante e diferente no outro lado do Atlântico. O caso contrário ocorre no pequeno texto “Ogun Igbo-Igbo”, (Brasília, 1990), [54] analisando para o público brasileiro um ritual para este Ogum, muito cultuado em Ishede, no Benin, fronteira com a Nigéria.
No grupo de textos que falam sobre as religiões africanas deve ser incluído o texto “Etnografia religiosa iorubá e probidade científica” (Rio, 1982), difícil de ser encaixado em um dos outros grupos temáticos. O texto revela posturas éticas e metodológicas de Verger, mostrando de que forma ele trabalha com informações orais e textos mais antigos de viajantes, padres e outras fontes. No centro da abordagem encontra-se a questão da interpretação de dados e textos históricos, referentes à religião. Verger defende uma interpretação cuidadosa que leva em conta o contexto do surgimento destes textos, sem querer aplicar teorias preconcebidas.
A questão do chamado sincretismo religioso é abordada diversas vezes: em “Syncretisme” (Paris, 1983), publicação com diversas fotos, que tenta abordar o chamado sincretismo religiosos na sua dimensão histórica, mostrando possíveis hipóteses para o seu surgimento e com um enfoque parecido com o de “Afro-catholic Syncretism in South America”. [55] A mesma questão aparece também no centro da publicação “African Cultural Survivals in the New World: The Examples of Brazil and Cuba” (Lagos, 1978), que é acompanhada também por fotos. Além disso existem trechos de textos em diversas outras obras, que abordam a questão do sincretismo, embora nem todas possam ser mencionadas. [56]
A questão do transe é abordada no texto “Role joué par l’état d’hebetude au cours de l’initiation des novices au culte des orisha et vodoun” (Dakar, 1954), e mais tarde também numa conferência na Bahia (1955) “O Estado de ‘ere’ ”, publicado nos Anais da 2ª Reunião de Antropologia (Salvador, 1957), como tradução do primeiro texto. Os dois textos tratam mais da questão de um estado de transe intermediário, o chamado estado de erê. O texto “The role of trance in yoruba worship”, conferência proferida em Ifè, mais tarde é transformado em “Trance states in orisha worship”, publicado na revista Odu em 1963. Neste texto Verger aborda as diversas tentativas de explicação e as teorias acerca do estado de transe na literatura antropológica e sociológica, completando e exemplificando com descrições dos diversos cultos aos orixás na África e no Novo Mundo. Sobre a mesma temática escreveu ainda “Trance and Convention in nagô-yoruba spirit mediumship” (London, 1969), que em parte se baseia em parte em “Une sortie de ‘iyaô’ dans un village nago au Dahomey” (Porto Novo 1951), e descreve diversos rituais observados por Verger, culminando com a descrição de uma festa para Ogum Edeyi em Ilodo, na Nigéria, incluindo a tradução das letras das músicas cantadas na ocasião. Em “Transe de possession religieuse chez les yoruba et les fons du Nigeria et de la Republique du Bènin et chez les descendants au Nouveau-Monde”, texto apresentado/publicado na ocasião de um colóquio em Nice em 1985/86, Verger destaca as diferenças entre as formas de cultuar os orixás na África e no Novo Mundo. Na África o orixá é uma herança familiar, enquanto no Brasil é uma responsabilidade mais individual, que não pode ser delegada. Ele ainda aborda a questão do sincretismo, dos arquétipos e finalmente das diversas formas de transe. O texto é acompanhado de muitas fotos, parte da exposição realizada durante o colóquio. [57] A questão do transe também é abordada em um capítulo de Notes, e em Orixás que retoma a pesquisa iniciada com Notes, porém se volta para um público menos científico, abordando de forma mais simples o universo dos orixás na África e no Novo Mundo. Este texto denso, porém não pesado, é acompanhado por fotografias. Novidade neste livro são as descrições de arquétipos que remetem à questão levantada anteriormente referente ao que é inato numa pessoa.
Um dos textos mais procurados, e publicado diversas vezes, é o que aborda o poder feminino na forma das Mães Ancestrais, baseado em histórias de tradição oral, ìtàn, do domínio dos babalaô: “Grandeur e décadence du culte de Iyami Oshoronga (ma mére la sorciére) chez les yoroubá” (Paris, 1965), mais tarde publicado duas vezes em português, uma vez sem os ìtan (1992) e a outra com estes (1994). [58] A posição das mulheres é abordada em um outro artigo, pouco conhecido, apresentado em São Luís do Maranhão durante um encontro organizado pela UNESCO. Trata-se de “A contribuição especial das mulheres ao Candomblé do Brasil” (1985), um texto curto que aborda diversos aspectos da vida das mulheres ligadas ao candomblé, confrontando com a vida na África. Chegou a ser republicado no volume Artigos (Salvador, 1992), em conjunto com aquele sobre as Iyamis. Tematicamente poderíamos fazer uma ponte com a já mencionada publicação da história de Na Agontimé.
Neste grupo de textos sobre a religião podem ser incluídos ainda “La societé des Abiku, les enfants qui naissent pour mourir” (Dakar, 1968), mais tarde publicado pela revista Afro-Asia (Salvador, 1983), abordando a questão das crianças que morrem, antes de se tornarem adultos, incluindo uma grande quantidade de ìtàn, e “The Yoruba High God” (Ibadan, 1966), onde Verger trabalha basicamente com fontes de viajantes, missionários e antropólogos relativo à questão da estrutura religiosa da cultura iorubá, abordando a idéia de um Deus supremo. As diversas opiniões, desses autores, são analisadas e revistas frente às influências de religiões como o cristianismo e o Islamismo, ou então vistas frente à luz do termo ‘axé’, que expressa uma força maior. “Notion de Personne et Lignée familiale chez les yoruba” (Paris, 1971), apresentado originalmente num colóquio do CRNS no mesmo ano, faz uma ligação entre a questão da formação da personalidade da pessoa e a organização social, por esta razão tido por Verger como texto de cunho sociológico.
No grupo das publicações que podem ser consideradas de temática e abordagem sociológicas, há algumas escritas em parceria com colegas, especialmente com Roger Bastide e Alexandre Adandé nos anos 50. Em 1958 Bastide viajou juntos com Verger pela África Ocidental - por dois meses e meio - e escreveu 5 artigos sobre esta viagem, destinados a uma publicação no Cruzeiro, embora, pelo que consta, até hoje nunca publicados. Verger menciona neste grupo um outro texto que ele escreveu em colaboração com Roger Bastide: “Contribution à l’étude sociologique des marchés nago au Bas-Dahomey” (Paris, 1959), que se baseia na pesquisa desenvolvida pelos dois amigos na África, em 1958. Eles descrevem a organização interna dos mercados e analisam as suas redes de contato. [59] O texto muitos anos depois foi publicado em português (Salvador, 1992). "Tam-Tam Avohu” (Dakar, 1953), escrito em colaboração com Alexandre Adandé, aborda jovens que se reunem no Dahomey para um desafio musical entre oponentes preparados e protegidos por poções mágicas e amuletos. O texto traz também as letras das canções, em fon, e as suas traduções em francês. Em “Conditions de vie des esclaves à Bahia au XIXé siècle et leur emancipation” (1969)*, Verger trabalha basicamente com anúncios de jornais a respeito de escravos fugidos e à venda. Deve ser uma versão do cap. VIII de Fluxo e Refluxo, que traz o mesmo título desta publicação. [60] Neste contexto também podemos incluir o texto: “Processions et carnaval au Brésil” (Paris, 1976). Ele parte da descrição do barroco em Bastide, [61] abordando especialmente o barroco de rua. A partir desta afirmação Verger analisa a vida festiva das ruas, as procissões religiosas com o seu aspecto exuberante e os paralelos com as festas carnavalescas de tempos mais recentes. [62]
Uma das áreas que acompanhou Verger por mais tempo foi sem dúvida a abrangência da cultura oral e seus processos de transmissão e memorização. Especialmente os conhecimentos na área de Ifá e da etnobotânica se beneficiam destes conhecimentos orais, além da religião dos orixá já abordada. Antes de escrever exclusivamente sobre Ifá ou a etnobotânica, Verger publicou diversos outros trabalhos menores que abordavam a questão da transmissão de conhecimento. A parte poética e mnemotécnica é abordada em “Automatisme verbal et communication du savoir chez les yoruba” (Paris, 1972), onde discute a questão da memória coletiva e da transmissão oral a partir da força que a palavra pronunciada tem para os iorubás, analisando em seguida os diferentes processos linguísticos para realização deste objetivo. O texto inclui um subcapítulo botânico, sobre o sistema iorubá de classificação de plantas. Existe ainda uma interessante complementação, o praticamente desconhecido escrito sobre os baixo-relevos do palácio de Abomey, “The bas-reliefs in the royal Palace of Abomey” (Ibadan, 1957), que analisa como os desenhos ali encontrados ajudam na memorização de dados históricos. Neste grupo de textos que abordam a questão da transmissão oral também podemos incluir: “Oral tradition in the cult of the orisha and its connections with the history of the Yoruba” (Ibadan, 1956), publicado numa versão resumida, e “Oriki e Mlenmlen” (Paris, 1965), que foi publicado numa coletânea de textos sagrados da África Negra, organizados por Germaine Dieterlen. Este último traz basicamente transcrições de Orikis, baseadas em Notes.
Durante diversas décadas Verger se envolveu com a questão do poder das plantas medicinais e suas atribuições tanto litúrgicas, quanto relativas à adivinhação. Obviamente este interesse tinha uma ligação íntima com todo complexo conhecimento dos babalaôs voltado para a divinação, e os dois aspectos juntos constituem, de certa forma o centro da força da cultura iorubá. Um dos planos de Verger era escrever ainda um livro sobre Ifá, conforme ele anunciava e planejava desde “Automatisme verbal”, plano este que infelizmente não se concretizou. Por este motivo só existem alguns trabalhos menores de Verger sobre o tema, porém nem todos localizados e disponíveis. [63]
O primeiro texto publicado sobre adivinhação foi escrito em parceria com Bastide “Contribuição ao estudo da adivinhação em Salvador (Bahia)”, em 1953 (São Paulo). Trata-se de um dos primeiros sobre o assunto em português, que também traz uma quantidade grande de gráficos e tabelas ilustrativas. O livro Dílógún- Brazilian Tales of Divination, Discovered in Bahia. (Ibadan, 1989) é praticamente desconhecido no Brasil. Ele foi publicado numa edição bilingüe (português-inglês) na Nigéria e baseia-se no texto original e manuscrito de tia Agripina, do Afonjá do Rio de Janeiro, relatando as histórias de odu conhecidas e transmitidas naquela casa. Este texto, chegou às mãos de Mãe Senhora, que o emprestou a Verger. [64] Uma pequena parte deste livro foi publicada em inglês como “Yoruba Tales from Brazil” (Port Harcourt, 1980). Relativo à temática das histórias e do conhecimento do culto de Ifá, Verger sempre quis completar suas anotações para conseguir finalizar as suas pesquisas, realizadas até 1979, na Nigéria.
É importante observar que Verger menciona, já nos anos 50, pesquisas relativas à etnobotânica e à Ifá junto, pois as duas áreas se nutrem do conhecimento transmitido oralmente pelos babalaô. Na lista das publicações referentes à etnobotânica, podemos observar que a grande maioria surge no final da vida dele, embora trabalhasse desde os anos 50 sobre plantas e seus usos rituais, em conexão com o conhecimento do babalaô. Só algumas datam de uma época anterior, resultado das pesquisas realizadas quando morou na Nigéria, entre os anos 1963 e 1966. (É uma fase bastante densa quando Verger prepara a sua defesa e doutorado na Sorbonne, em 1966.) A primeira publicação sobre plantas medicinais é Awon ewé Osanyin. Yoruba Medicinal Leaves (Ifé, 1967), mais tarde base para Ewé. Este pequeno livro em iorubá e inglês traz textos orais recitados por babalaôs nos casos em que as histórias de odu remetem à utilização de folhas, são versos que obedecem a uma lógica e estrutura próprias. A utilização correta das folhas medicinais é memorizada pelos babalaôs a partir de pequenos versos, dos quais Verger coletou cerca de 2000, tendo publicado 180 na referida publicação e mais 15 numa publicação menor, intitulada “The poetry of leaves” (Ibadan, 1967), querendo ressaltar com estes textos especialmente os aspectos estéticos. Na mesma época em que Verger publicou estes dois trabalhos, também escreveu um outro pouco conhecido, “Tranquilizers and stimulants in Yorubá pharmaceutics” (Ibadan, 1966), originalmente apresentado num congresso, que relata as experiências curiosas de um médico, Dr. Lapeyssonie, na época diretor de um hospital em Ouidah, com a Rauwolfia serpentina e Sabicea calycina. Este mesmo texto, mais tarde será publicado em alemão como “Tranquilizer und Stimulanzien in der Behandlung durch Pflanzen bei den Yoruba” (Essen, 1985), em uma revista organizada pelo escritor alemão Hubert Fichte, que realizou suas pesquisas de etnobotânica no Brasil nos anos 80. Só após publicação dos textos mais dedicados à parte linguística dos versos pronunciados pelos babalaôs, Verger começou a publicar também a respeito da parte botânica. Isso se deve ao fato dele ter colecionado plantas durante muitos anos, constituindo um herbário identificado e classificado cientificamente pelo Serviço Botânico em Ibadan, posteriormente mandado para Paris, conforme cartas de 1970, confirmando o envio de 1210 plantas, em 1969. Além disso Verger tinha um herbário de cerca de 150 plantas da flora baiana, que ele tinha organizado com pessoas do candomblé, como Mãe Senhora e Olga do Alaketu, depois cientificamente identificados e classificados pelo professor Alexandre Leal, da UFBA. Este herbário mais tarde foi doado ao Departamento de Botânica do Instituto de Biologia (1976).
A partir desta data a atenção de Verger vai muito além de uma descrição botânica, segundo às normas do sistema de Linéu: ele começa a abordar o sistema iorubá de classificação das plantas, até então completamente desconhecido do grande público. São publicados: “The use of plants in yoruba traditional medicine and its linguistic approach” e “Poisone (oro) and antidotes (ero)” (ambos Ifé, 1976/77), dois trabalhos que talvez possam ser também vistos como preparativos de sua grande publicação Ewé. O uso das plantas na sociedade iorubá (São Paulo, 1995). Depois destes Verger fica durante anos sem escrever sobre o assunto, tentando montar um grande quebra cabeça, que foi o seu muito esperado livro Ewé. De certa forma ele retoma a linha do estudo linguístico, indicando os diversos ofo e a função do verbo atuante. Do corpo do livro constam ainda diversos índices com todas as indicações botânicas possíveis, apesar de não abordar a parte das plantas dentro do contexto baiano. Porém, este livro não constitui o seu último texto sobre a questão: segue ainda uma série de escritos, preparados no final de sua vida - alguns só publicados após a sua morte -, como “Del papel de las plantas psicoativas en la iniciacion a ciertas religiones africanas” (Tarapoto, 1995). Neste Verger ressalta o papel das plantas durante a iniciação para reforçar características pessoais inatas e afastar influências recebidas pela educação, assim fortalecendo a personalidade do neofito. Outros textos sobre a questão foram escritos em colaboração com Ming Anthony, uma etnobotânica francesa, “Gun, Plantes a action tonificante et stimulante chez les yoruba en Afrique et au Brésil” (1991), tratando dos remédios estimulantes; “Isoye: Médications de la memoire chez les yoruba en Afrique et au Bresil” (Paris, 1996), abordando a questão de remédios que fortalecem a memória; “A la recherche des plantes perdues, les plantes retrouvées par les descendants culturels des yoruba au Brésil” (Paris, 1995), fazendo uma ligação entre as plantas utilizadas nos diversos rituais nos dois lados do Atlântico. Os textos “Les corps mystique dans la tradition Yoruba: Sanponna et la peau” (Paris, 1997) e “Sanponna, God of Variola and his remedies in the tradition Yoruba” (1997) abordam especialmente a farmacologia referente às plantas de Omolu/Sapona, incluindo, no caso do penúltimo texto, diversas informações a respeito do lado místico de Omolu, a sua ligação com os mais diversos tipos de plantas, além de analisar a preparação de 66 remédios relacionados com problemas de pele. Todos estes textos publicados a partir de 1991, além de identificação científica das plantas abordam diversos aspectos da medicina tradicional na Nigéria e no Brasil. É fundamental ressaltar que durante um estudo de classificação e reclassificação das plantas africanas pelo Dr. Burkill em Londres ( Kew Garden, o Jardim Botânico), um grande número de plantas foi citado conforme as pesquisas desenvolvidos por Verger durante as décadas anteriores. [65]
Verger escreveu sobre experiências de pesquisas desenvolvidas com alguns dos seus melhores amigos. Sobre seu grande amigo Alfred Métraux, que considerava seu irmão gêmeo, pois haviam nascido com apenas 5 horas de diferença, Verger escreveu “30 ans d’amitié avec Alfred Métraux, mon presque jumeau” (Paris, 1992), além de ter participado de forma decisiva na preparação e publicação da correspondência entre ambos “Le pied à l’etrier”, (coordenado por Le Bouler). Métraux já tinha trinta anos de morto naquela época. Da mesma forma Verger escreveu sobre as atividades de pesquisa de Roger Bastide, seu outro grande amigo, na África, onde Verger foi seu cicerone, “As múltiplas atividades de Roger Bastide na África (1958)” (São Paulo, 1993), publicado posteriormente em francês (1994). Considerando que estes artigos abordam, além dos aspectos relacionados com as pesquisas dos seus amigos, obviamente também aspectos autobiográficos, deveria ser mencionado também um publicado sobre a litografia de seu pai “La litho de mon père” (Paris, 1994), ressaltando alguns aspectos de seu passado pessoal. Neste grupo de textos autobiográficos, poderia ser incluído também um pouco conhecido, que aparentemente aborda também aspectos que poderíamos classificar como de ordem metodológica, ou de definição de áreas, até intuindo futuros desenvolvimentos na antropologia visual. Trata-se de um trabalho muito curto, “Ethnographie et photographie” (Lucerne, 1954), publicado em inglês, francês e alemão, onde Verger aborda a questão de como ele fotografava, ressaltando aspectos pessoais. O pequeno texto “Souvenirs de Reportage, Paris Soir (1934/1935)” (Paris, 1990), fala do tempo em que fazia reportagens para esta revista. Um dos seus livros de fotografia também inclui aspectos e autobiográficos: trata-se de 50 anos de fotografia (Salvador, 1982). Neste livro, talvez como em nenhum outro, fica mais do que perceptível o estilo pessoal de Verger, que tinha uma capacidade de tornar vivas as suas palavras, como se fossem talvez imagens animadas. Não podemos deixar de mencionar a publicação de notas autobiográficas em português, que se baseiam no texto traduzido de Le Messager, revisto pelo próprio Verger: “Algumas datas na vida de Pierre Verger” (Salvador, 1995). [66]
Neste contexto de textos autobiográficos também devem ser mencionado textos preferidos de Verger que expressam algo fundamental. Dois dos livros que Verger muito gostava são Notícias da Bahia-1850 (Salvador, 1981) e Os libertos. Sete Caminhos na Liberdade de escravos da Bahia no sec. XIX (Salvador, 1992). O primeiro, planejado originalmente para ser publicado em francês, escrito no estilo de uma história social dos costumes na capital baiana, envolvendo todos os grupos sociais da cidade e seus contatos mútuos, exprimia para ele a mensagem da cultura negra, que se impunha com muita força no âmbito da história baiana. O livro Os Libertos, por sua vez, mostra, a partir de sete histórias de vida – o título provisório foi durante muito tempo “As sete vidas”-- as diversas opções que os escravos africanos escolhiam ao serem libertos, fossem formas de adaptação e/ou de resistência. Gostava muito também de um dos últimos álbuns fotográficos, Retratos da Bahia (Salvador, 1981) e Centro Histórico de Salvador (Salvador, 1989), mostrando a Bahia que Verger tanto gostava e pela qual tinha se apaixonado quando chegou aqui em 1946. O texto de Retratos mostra – igual ao do livro 50 anos de fotografia – muitos traços autobiográficos. [67]
É bom ressaltar como estes últimos parágrafos nos remetem ao início deste texto, quando observamos a versatilidade de Verger e a sua linguagem visual poética, que perpassam tantos “gêneros” estilísticos e temáticos diferentes, se assim podemos caracterizar a amplitude de sua expressão. É importante ressaltar a linguagem especial e singular de Verger: com as suas publicações ele conseguiu se comunicar com públicos bem diferentes. Muitas vezes as suas publicações com fotografias da África e do Brasil, faziam com que as pessoas quisessem conhecer o que ele retratava. O olhar de Verger certamente foi fundamental para uma outra nova visão da cultura afro-brasileira e africana, porque abriu e criou uma nova forma das pessoas olharem. Quando Verger começou a fotografar, a grande maioria ainda não estava acostumada a enxergar o lado estético da cultura africana e afro-brasileira. [68] O seu estilo fotográfico, que mostrava sempre o vivo, o momento espontâneo e nunca o artificialmente arranjado, se complementa com o estilo escrito, quando se trata das legendas das fotos. Não faltam humor, ironia e autocrítica. Nos seus textos científicos deixava falar as fontes históricas, os seus informantes, a experiência de vida, detestando teorias e preferindo os fatos da vida, devidamente colocado nos seus contextos históricos e obviamente obedecendo às regras acadêmicas. Não podemos deixar de mencionar que Verger não somente observava, fotografava, anotava e gravava como também chegou a realizar alguns filmes e vídeos que foram realizados a partir dos anos 70. “Les molécules sacrée” realizado em 1972, mais tarde transformado em “Transes de possession religieuse au Dahomey” (1972), aborda a questão da etnobotânica e contou com a colaboração do biólogo francês Jean-Marie Pelt. Mais tarde realizou “Bresiliens d’Afrique et Africains du Brésil” (1975), baseado em imagens registradas a partir de 1973. Existe também um vídeo sobre o carnaval, referente ao final dos anos 40, “Carnaval no Brasil nos anos 40” baseado em fotografias de Verger desta época, apresentado em Nice [69] e em São Paulo em 1984. Em 90 ainda realizou o vídeo Atun Padê na Bahia, que igual a outros filmes mostrava as relações mútuas entre a Bahia e a África Ocidental. [70]
É curioso observar que Verger de certa maneira antecipa as mais recentes transformações na área da antropologia que se volta para uma maior interação entre o sujeito estudado, o ator social, e o sujeito estudioso, o observador. [71] Mas na verdade o estilo de Verger não se enquadra em nenhuma vertente, teórica ou ideológica, mantendo-se ele independente de “gavetas” ou classificações. Este fato nos remete novamente a questão da interdisciplinariedade, usando as diversas linguagens entre a fotografia, o filme e a palavra escrita, e a gravação sonora, passando constantemente pelas mais diversas áreas temáticas e disciplinas diferentes. Ele se manteve fiel a certas idéias, a um estilo de vida e um caminho próprio, embora nem sempre soubesse o que queria, mas sabia o que não queria, como ressalta em diversas entrevistas. Porém, talvez sem que ele se apercebesse, ele inconscientemente fez o que no fundo de seu ser queria, apenas confirmando o que tanto ressaltava em relação ao inconsciente, especialmente ligado à religião: a sua extrema importância! Talvez mais correto seria dizer que a obra de Verger é simplesmente humana, tanto em sua origem quanto em sua aplicação, na essência e na linguagem. Aliás uma obra que só em parte foi publicada, oferecendo ainda muitas descobertas e surpresas futuras. [72]
[24] Brésil (Paris 1951) foi publicado em colaboração com A.Bom e Marcel Gauteroth, este último um fotógrafo francês que diversas vezes abordou as mesmas temáticas que Verger. Eles se encontraram muitas vezes, porém depois se afastaram.
[25] Este livro provavelmente foi publicado graças à ajuda financeira do casal Dominique e Jean de Ménil, que sensibilizados pela situação em que encontraram Verger na Argentina, em 1941-42, onde ele passou um período não muito feliz de sua vida, possibilitaram a sua viagem da Argentina para o Peru.
[26] Existiu um projeto da Editora Civilização Brasileira, que propôs, logo após sair o seu livro Bahia de tous les poetes, em 1955, na Suiça, a publicação de um livro fotográfico sobre a Bahia com o texto de Roger Bastide e fotos de Verger. Porém este livro nunca foi publicado. A única publicação ligada mais ou menos a este contexto é um texto publicado na revista A Cigarra – Magazine que fazia parte do império dos Diários Associados. Chama-se “Candomblé”, publicado em junho de 1949, pp.4-9, 18 e 24.
[27] Verger chegou a realizar durante o tempo de sua primeira contratação por O Cruzeiro mais que 110 reportagens fotográficas, embora destas provavelmente somente 80 tenham sido publicadas. Durante o tempo de sua contratação para O Cruzeiro Internacional, ele realizou mais que 80 reportagens, das quais só algumas poucas foram publicadas, embora se desconheça os motivos. O destino deste valioso material fotográfico até agora não foi esclarecido. É importante ressaltar que nesta segunda fase Verger muitas vezes fotografava e escrevia. Existe ainda a maioria destes manuscritos de Verger, que constituem uma parte considerável das reportagens durante a segunda contratação.
[28] Gilberto Freyre, Problemas brasileiros de antropologia, 2ª ed. Rio de Janeiro, José Olímpio, pp. 263-313.
[29] Gilberto Freyre, Bahia e Bahianos, Salvador, Fundação das Artes/EGBA, 1990, pp.91-134.
[30] Até agora encontramos nove cartas de Verger para Freyre e duas cartas de Freyre para Verger. Na carta de 27 de junho de 1950 Verger indica detalhadamente todo material que enviou para Freyre, incluindo notas de pesquisa e material bibliográfico relativo à África. É importante ressaltar que para o levantamento do material Verger já começou a realizar os primeiros trabalhos em arquivos baianos em busca de material complementar.
No texto, mencionado anteriormente, (ver nota 13), Freyre diz: “Donde senti-me feliz em ter em Pierre Verger um colaborador nas pesquisas em que há anos me empenho em torno de ex-escravos abrasileirados pelo Brasil. Voltando à África, fundaram eles em terras africanas uma espécie de civilização afro-brasileira da qual ainda hoje se encontram sobrevivências interessantíssimas: assunto do posssível livro que espero com a colaboração de Pierre Verger.” Este livro, pelo que consta, não foi publicado.
[31] O repertório é gravado nos anos 50 por Luís Heitor de Azevedo em Paris. Esta gravação encontra-se na Library of Congress e também no acervo da própria Escola de Música do Rio de Janeiro, conforme carta de Luís Heitor a Verger de 1984.
[32] Uma das famílias de descendentes de brasileiros que retornaram ao Benin e mantêm estas tradições até hoje, foi gravada pelo etnomusicologo Marcos Lacerda Brenda. O repertório foi lançado em CD recentemente: Drama, e Fetiche. Vodun, bumba-meu-boi e samba no Benin. Funarte, Dicionário Sonoro do Folclore Brasileiro, vol. 48.
[33] Jornal do Comercio, Recife 31/8/60.
[34] Entre as publicações que surgiram a partir das pesquisas desenvolvidas por Verger e Rouget, podem ser mencionados alguns discos de Rouget, que trazem fotos e, às vezes, textos de Verger: Dahomey, Musique de Princes. Fête des Tohosou, Musée de l’Homme LD 5- Contrepoint MC 20.093, 1955; Ogun Dieu de Fer – Chants d’Afrique Occidentale, Musée de l’Homme LD 12, Contrepoint MC 20.159, 1958; Fête pour l’offrande des premières ignames à Shango au Dahomey, Musée de l’Homme LD 2, 1965; Musique des Revenants, e dois CD’s acompanhando o livro Un Roi africain e sa musique de cour, Paris, CNRS Editions, 1996.
[35] ver Antônio Olinto, Brasileiros na África, São Paulo, GRD, 2ª, 1980, p. 261. Infelizmente ainda não foi possível esclarecer a data exata desta emissão radiofônica. Tampouco sabemos se por ventura é idêntica com um programa veiculado em 22/12/58, dentro de uma série chamada “Vamos cantar a Bahia”. Este último aborda a temática dos brasileiros retornados à África. O texto deste programa, realizado por Verger, encontra se manuscrito no acervo da FPV.
[36] Marianno Carneiro da Cunha, Da Senzala ao sobrado. Arquitetura brasileira na Nigéria e na República Popular do Benin, Introdução de Manuela Carneiro da Cunha, ensaio fotográfico de Pierre Verger, São Paulo, Edit. Nobel, EDUSP, 1985.
[37] Verger, Pied, p. 124. Neste contexto é importante lembrar a história das reportagens com Freyre, onde Verger, talvez sem que ele se apercebesse, já relata indiretamente as suas pesquisas, embora ainda não chegado ao ponto de redigir de fato.
[38] Torna-se necessário incluir neste grupo alguns textos apresentados em congressos e seminários, dos quais não existem informações detalhadas a respeito da possível publicação posterior. Neste grupo entram conferências como “Raisons économiques de la prédominance des esclaves Nago Yoruba à Bahia au XIX siècle” (Porto Novo, 1965) e o texto “Vente aux enchères à Freetown des Navires négriers saisis au XIXe siècle par les croisurs britanniques et le fructueux commerce qui en résultait”, Sierra Leone Studies, Fourah Bay College, Freetown, 1966, 24p. * (1966) baseado em documentos achados nos arquivos de Londres.
[39] Infelizmente não podemos afirmar se este texto realmente foi publicado pela Universidade de Ifé em 1966, como indicado por Verger.
[40] Este aspecto foi retomado em Os Libertos e também “Moslem revolts in Bahia”*. Infelizmente não temos este texto no acervo da Fundação, só existe o seu resumo feito pelo próprio Pierre Verger. Ele aborda as revoltas na Bahia entre 1807 e 1835, interpretando especialmente o último como continuação da Guerra Santa iniciada no norte da Nigéria, em 1804.
[41] Alfred Metraux, “Les Indiens Kamakan, Pataso et Kutaso”, Revista del Instituto de etnologia de la universidad nacional de Tucumán, Tomo I, (Tucuman), 1929, pp. 238- 289.
[42] Diversos dos textos menores foram publicados em revistas nem necessariamente científicas.Ele não tinha nenhuma ressalva em publicar também em revistas não científicas. Encontram-se alguns textos na Revista Balafon, da Air Afrique (1988) e outras como El Paseante, revista espanhola, voltada para a área de artes, em um número bilíngue (1988), na revista Bric a Brac de Brasília (1990), mais voltada para a área de literatura, além da revista Nigerian Magazin.
[43] O texto foi republicado como “Os que no Brasil permaneceram fiéis aos valores africanos. Na Agontimé” em Os libertos, pp. 66-86.
[44] Neste contexto é importante ressaltar que estas fotos de Verger podem servir ainda como ajuda numa reconstituição do acervo do IGHB, cujo acervo foi também documentado por Raul Lody em 1984, antes de ter desaparecido, como foi ressaltado no texto “Os primeiros registros sonoros da música do candomblé ou as armadilhas da pesquisa histórica na etnomusicologia” no GT 19 na XX reunião da Associação Brasileira de Antropologia (ABA), (Lühning 1996, manuscrito).
[45] Como exemplo podemos citar “Rafael, o pintor”. Este artigo foi publicado em O Cruzeiro, falando deste curioso pintor que era ao mesmo tempo pintor e pai-de santo. O Cruzeiro, 6.1. 1951, pp.62-65 e 82, com o texto de Odorico Tavares.
[46] Para uma maior compreensão do contexto recomenda-se o interessante texto de Ulli Beier “Erinnerungen an Pierre Fatumbi Verger”, pp.157- 165.
[47] Mais detalhes sobre a história destes bronzes e suas cópias encontram-se em William Fagg and Leon Underwood, “Examination of the so-called “Olokun” Head of Ife, Nigeria”, Man, no. 1, (January, 1949), pp. 1-7.
[48] As publicações com Alexandre Adandé, futuro ministro de Agricultura e da Justiça do Benin, são basicamente dos anos 50.
[49] Este livro foi traduzido para o inglês por Willfried Feuser para ser publicado, em Ibadan, como “Gods of África”, porém por razões desconhecidas também não se realizou. Dieux foi um livro tão importante que virou referencial para outros autores que algumas vezes, até sem a devida identificação, usaram este livro como base, provavelmente por representar uma das publicações mais confiáveis e acessíveis na época. Uma vez ele foi copiado praticamente na íntegra, incluindo alguns erros crassos de tradução para o português, e uma segunda vez tendo sido utilizado como base para um livro infantil. Em nenhum dos dois casos houve indicação da fonte original. Num terceiro caso houve, além da citação não indicada de diversas páginas de Fluxo e Refluxo, também a utilização indevida de muitas fotos de Orixás, transformadas em desenhos idênticos, sem dar nenhum crédito a Verger ou a fonte original utilizada. Trata-se dos livros de José Ribeiro, Orixás africanos, Rio de Janeiro, Editora Espiritualista Ltda.,1961; Ganymédes José, Na terra dos orixás, São Paulo, Editora do Brasil, 1988, e finalmente de Zeca Ligiéro, Iniciação ao candomblé, Rio, Record, 1992.
[51] O total das fotos coloridas existentes na Fundação é de aproximadamente 1100 negativos, resultado do tempo em que ele era colaborador de O Cruzeiro International.
[52] Um exemplo é “Oshagiyan Festival at Ejigbo” * (1960) é uma descrição da festa anual com fotos, publicada no Nigerian Magazin, em um número que infelizmente não se encontra na biblioteca da Fundação.
[53] Ver também “Tentative d’alienation, syncretisme et resistence religieuse des africains transportés autrefois au Brésil” texto apresentado no colloquio “La negritude at l’Amerique Latine” (Dakar 1974), em que ele aborda as diversas formas de reação dos escravos ao meio opressor dos senhores brancos, incluindo as alianças e negociações possíveis. Do texto “The status of Yoruba religions in Brazil”, apresentado em 1976 na Universidade de Ifé, não sabemos se posteriormente chegou a ser publicado. Verger descreve a situação histórica das religiões africanas no Brasil, incluindo uma visão geral das diversas formas como se apresentam em diferentes regiões.
[54] Este pequeno artigo, publicado numa revista muito mais voltado para questões literárias, está acompanhada por uma entrevista com Verger. O texto publicado em seguida é uma versão modificada do capítulo de Orixás que aborda Ogum. É importante ressaltar que as fotos que acompanham o artigo e dois orikis traduzidos para o português não são idênticas aos publicados em Orixás.
[55] Este texto foi apresentado em Ifé, e existe como manuscrito na FPV. Ele traz no final a informação de que teria sido publicado no Nigeria Magazin nº. 78. Infelizmente não tive como averiguar, porque não temos este número da revista no acervo da FPV. Um outro texto que poderia ser incluido aqui seria “West african religions and modern forms of living”, apresentado ao Extra-Mural Department da Universidade de Ibadan em 1959 (20 pp.), onde ele aborda diversos aspectos do sincretismo.
[56] Um dos exemplos mais marcantes que Fatumbi dava para explicar a questão do sincretismo, se referia a uma definição dada por Balbino, o pai de santo do Axé Opô Aganju, que comparou a convivência entre o candomblé e o catolicismo da seguinte forma: é como água e azeite dentro de um cálice, estão juntos, dentro de um mesmo recipiente, mas mesmo assim não se misturam. A mesma coisa acontece com as duas religiões: elas convivem lado ao lado mas não se misturam.
[57] Na mencionada publicação ainda consta a transcrição de uma discussão com diversos convidados, entre eles Verger, pp.219- 233.
[58] Ainda existe uma tradução do mesmo texto para o italiano, também sem os ìtán, publicado em 1997.
[59] O texto original era maior e foi apresentado num congresso na Universidade de Ibadan, em 1958. Só a versão reduzida foi finalmente publicada.
[60] Pelo fato de não termos o texto no acervo da Fundação, não é possível entrar em mais detalhes ou comparar os textos. Verger colocou ele no grupo dos textos de cunho sociológico.
[61] Roger Bastide, Imagens do Nordeste Místico em Branco e Preto. Rio de Janeiro, Empresa Gráfica O Cruzeiro,1945. O texto de Verger foi escrito em homenagem a Bastide.
[62] Este pequeno texto, traduzido mais tarde para o português, deveria ser visto no contexto de todas as pesquisas que Verger fez sobre o carnaval baiano. Verger juntou um grande acervo fotográfico documentando esta tradição nos anos 40 e décadas posteriores. Na revista O Cruzeiro também há alguns textos sobre afoxés, festas de largo, a Segunda-feira gorda na Ribeira, samba e outros temas correlacionados com o carnaval.
[63] Entre os textos não disponíveis na Fundação, mas talvez publicados, inclui-se a comunicação “Oralité et divinação par Ifá” * (1972), apresentada em Chantilly, no encontro “Afrique et langage”. Um outro texto é “Les formes syncretiques du culte d’Ifa en Nigeria” *, apresentado em 1963 em Bouaké, no encontro sobre sincretismo, que deveria ter sido publicado pela Editions du Seuil.
[64] Soube há pouco que este manuscrito que segundo a tradição da casa baseia-se na transmissão oral do Afonjá, teria sido de Agripina. Foi mencionado numa pesquisa de Reginaldo Prandi (USP) que chegou a encontrar a pessoa que de fato o redigiu. Trata-se do grande babalaô do Rio de Janeiro, Prof. Agenor Miranda Rocha, que colheu as histórias, contadas pela finada Vó Aninha. Um livro, abordando a trajetória destas histórias sairá em futuro próximo. Reginaldi Prandi, Caminhos de Odu, Rio, Pallas, 1998.
[65] As publicações do Kew Garden são uma espécie de índice etnobotânico da flora da Africa Ocidental.
[66] Para pessoas que tiverem interesse em mais informações autobiográficas podemos remeter às diversas entrevistas feitas com Verger, muitas vezes colocando na sua linguagem pessoal as suas vivências, experiências e reflexões. Neste contexto não podemos deixar de mencionar Ulli Beier, amigo e colega de muitos anos de convivência na Nigeria, que publicou um pequeno artigo sobre Verger “Erinnerungen an...(1997), já citado anteriormente, e um segundo, em que aborda as suas próprias experiências na mesma época em que Verger viveu na Nigéria. Ulli Beier “An einer kolonialen Universität” in Überschreitungen. Trickster Jahrbuch Bd.1, (Wuppertal, Perter Hammer Verlag, 1997), pp.83-112. Podemos citar também uma publicação de Emanuell Garrigues, que traz uma entrevista com Verger bastante esclarecedora, porque ele aborda alguns aspectos de sua metodologia de trabalho e sua visão estética “Entretien avec Emmanuel Garrigues. Pierre Verger”, in L’Ethnographie. Numero Especial . Ethnographie et photographie, CXXXIII année, Tomo LXXXVII, 1, (Paris, 1991), pp.145 –178.
[67] A encenação que foi feita de Retratos da Bahia com o Balet do Castro Alves (Coreografia de Debby Growald) foi uma grande alegria para Verger, pois transformou as suas belas fotos em movimento.
[68] Parece que até hoje não existe nenhum trabalho que faça uma avaliação da estética e da técnica fotográfica na obra de Verger. Podemos apenas indicar, além do já citado texto de Garrigues, um segundo do mesmo autor sobre esta temática: Emmanuel Garrigues, “Alfred Métraux et Pierre Verger, ethnologie et photographie”, in Presence d’Alfred Metraux, (Paris, 1992), pp.115-139.
[69] No Festival Brasileiro, onde teve um Colóquio “O Mediterrâneo nas tradições brasileiras e sua influência na música popular e culta”, organizado pelo musicólogo brasileiro Luis Heitor Correa de Azevedo.
[70] Recebemos informações ainda não confirmadas de que Verger teria filmado, já durante os anos 50, embora não tivesse ficado com este material. Infelizmente não tivemos como averiguar.
[71] Como autores destas novas vertentes podemos mencionar, entre outros, Erving Goffman, Alain Touraine, Ulf Hannerz e Alain Coulon.
[72] Um dos prováveis resultados deste levantamento exaustivo da bibliografia provavelmente será a preparação de diversos manuscritos inéditos para futuras publicações. Existem inúmeros textos em formato de reportagem, do tempo em que ele estava trabalhando para o Cruzeiro, escrevendo e fotografando. Estes textos na sua grande maioria não foram publicados, nem as fotos, embora não se saiba os motivos. Além disso temos certeza que existem meios para publicar ainda outros textos inéditos de Verger, incluindo inúmeras correspondências, além de gravações musicais, fotos, escondidos em todo acervo de anotações e manuscritos, guardados na biblioteca da Fundação Pierre Verger.