Charles Placide – “Em busca de Pierre Verger”

A CulturesFrance e a Fundação Pierre Verer organizaram entre os meses de setembro e novembro de 2009, a residência do fotógrafo africano Charles Placide, que resultou na exposição do seu trabalho na galeria da Fundação Pierre Verger, no Portal da Misericórdia, no Centro Histórico de Salvador. Charles Placide conviveu no Bairro do Engenho Velho de Brotas, onde fica a Fundação, e compartilhou sua experiência com adultos e crianças, muitos deles ligados ao Espaço Cultural Pierre Verger. 

Nascido em Bétérou, no Benin, em 1971, Charles Placide-Tossou se destacou como fotógrafo. No início dos anos 90, ele começou a fotografar e, em 1995, formou-se em fotojornalismo no “Institut Supérieur des Sciences de l’Information et de la Communication de Dakar (Senegal)”. Logo em seguida, seu talento foi reconhecido com o primeiro prêmio da “Quinzaine de la Photographie Béninoise”. Ao longo de sua carreira, Charles Placide-Tossou participou de diversas exposições em países como Brasil, Gabão, Portugal e Itália. Ele também atuou como correspondente no Benin para agências como Reuters, Afrikimages e Galbe, e no Togo para a revista Planète Jeunes. 

Durante a residência, e também no Benin, antes de vir para Salvador, o fotógrafo foi em busca de pessoas, conhecidas ou anônimas, que tiveram contato, estreito ou não, com Pierre Verger. Assim, ele registrou rostos de homens e mulheres que cruzaram pelo caminho de Verger no Brasil, na África ou na França. Partes desses rostos e corpos fotografados compõem a mostra de 35 fotografias que serão apresentadas na Galeria da Fundação Pierre Verger. O fotógrafo conseguiu assim, encontrar herdeiros do babalaô que iniciou Verger, na África, assim  como estudiosos africanos e brasileiros, amigos de sempre como Nancy ou Solange Bernabó, colaboradores de Verger na Fundação, amigos fotógrafos franceses, artistas, vizinhos e crianças que na época de Verger pediam bombom ou uns trocados ao fotógrafo.

Esse evento, organizado pela CulturesFrance (responsável francês pelo Ano da França no Brasil) e a Fundação Pierre Verger, além de dar nascimento a uma criação artística e mergulhar no passado de Verger, manifesta a política da sua Fundação de reforçar a ligação entre o continente africano, especialmente o Benin, e o Brasil, particularmente a Bahia, numa tentativa de continuação de aproximação entre os dois continentes, aproximação essa, da qual Verger dedicou a sua vida. Essa residência também foi possível graças aos esforços de André Jolly, amigo de Verger desde os anos 70, e que há anos mantém viva a ligação cultural e artística entre o Brasil e o Benin, levando artistas e bandas de um continente ao outro. 

A exposição

Esse evento, organizado pela CulturesFrance (responsável francês pelo Ano da França no Brasil) e a Fundação Pierre Verger, além de dar nascimento a uma criação artística e mergulhar no passado de Verger, manifesta a política da sua Fundação de reforçar a ligação entre o continente africano, especialmente o Benin, e o Brasil, particularmente a Bahia, numa tentativa de continuação de aproximação entre os dois continentes, aproximação essa, da qual Verger dedicou a sua vida. Charles Placide conviveu durante dois meses com afro-descendentes, no Bairro da Vila América, onde fica a Fundação, e compartilhou sua experiência com adultos e crianças, muitos deles ligados ao Espaço Cultural Pierre Verger.

 

 

 

 

O catálogo

Em busca de Pierre Verger (texto de André Jolly)

 

Mãe senhora apelidou Pierre ´Fatumbi´ Verger de “mensageiro”. E, por muitos anos, ele foi, de fato, durante suas viagens entre a Bahia e o Benin, um fiel mensageiro entre seus amigos dos candomblés de Salvador e, do outro lado do Atlântico, seus primos de Ouidah, Abomey, Porto Novo, Ifé, Sakété e  Keto.

 

Em 1992, na Namíbia, encontrei casualmente Jean-Loup Pivin, diretor das Éditions de la Revue Noire em Paris. E, também por acaso, em uma de nossas conversas, ele mencionou que procurava quase sem esperança entrar em contato com Pierre Verger, pois sonhava publicar um livro com suas fotografias. Respondi-lhe que conhecia Fatumbi razoavelmente bem e que ia visitá-lo numa próxima viagem ao Brasil. Chegando à casa de Pierre Verger, algumas semanas mais tarde, apresentei-lhe o projeto de Pivin. Assim nasceu o magnífico livro « Pierre Verger – Le messager », publicado no ano seguinte em Paris. Quando abri o livro,  tive a agradavel surpresa de ler na página 2: “ nossos agradecimentos à André-Jean Jolly, também mensageiro, pois,  sem  ele  esta obra jamais teria existido.”  

Naquele momento não imaginava que, alguns anos depois, iria dirigir o Centro Cultural Francês de Cotonou, no Benin, onde encontrei algumas pessoas que foram muito próximas de Pierre Verger: Nestor Ogoulola, Nondichao Bachalou, os professores Olabiyi Yaï, Félix Iroko, Mondjanagni, e muitos outros. Algumas pessoas me telefonaram para dizer que um amigo brasileiro os tinha prevenido  da minha chegada ao Benin e que eu conhecia Pierre Verger. Queriam saber se era verdade. Falei-lhes sobre Pierre, o Brasil e a Bahia. Eles se tornaram verdadeiros amigos. Assim, os laços engendrados por Pierre Verger continuavam, graças a eles, graças a nós, a unir o Benin e o Brasil.

No Centro Cultural Francês de Cotonou, organizei um concurso no âmbito do  ‘Mês da Fotografia’. Charles Placide-Tossou, um jovem fotógrafo, venceu as edições de 1998 e 1999. Tornou-se, aos poucos, o fotógrafo ‘oficioso’ do Centro Cultural. Sempre sorridente, sempre de bom humor, ele passou também a ser um amigo. Um amigo da nova geração que não tinha conhecido Fatumbi. A ele  apresentei o fotógrafo Pierre Verger.

Em 2007, Charles participou, como fotógrafo, da primeira grande exposição de arte contemporânea africana – no caso, beninense -, organizada pelo Museu Afro – Brasil em São Paulo : “O Benin está vivo ainda lá”, a mesma que está atuamente a mostra no novo Museu da Cultura Afro Brasileira, aqui em Salvador

No Benin, ele conheceu pessoas para as quais a memória de Pierre Verger continua bem viva. Fotografou algumas delas. Hoje, Charles está em Salvador, na Fundação Pierre Verger. Ele está em casa de Pierre Verger, pintada de vermelho, cor de Xangô o protetor desse lugar mágico. Ele encontra pessoas idosas, outras mais jovens que conheceram Fatumbi, vizinhos, amigos, colaboradores, compadres. Ele os fotografa.

A exposição que coroa sua residência em Salvador é uma homenagem a Pierre Verger. Trata-se também de uma contribuição de uma geração mais jovem a esses laços que unem o Benin e o Brasil.

Se Pierre Fatumbi Verger foi este incansável e insubstituível “Mensageiro entre dois mundos”, se na minha modesta posição pude facilitar intercâmbios entre o Benin e o Brasil, o papel de mensageiro é agora retomado por jovens e Charles Placide-Tossou, com seus retratos, é um exemplo brilhante. 

De qualquer modo, de uma coisa estou certo: em algum lugar onde quer que se encontre, Fatumbi nos observa e está muito contente em ver que é um beninense convidado para esta residência de fotografia em SUA Fundação, em ver que o movimento de vai-e-vem entre as duas terras que lhe eram as mais queridas, Bahia e Benin, continua e expande. Talvez  se lembre das palavras do seu amigo Roger Bastide, no prefácio do seu primeiro livro “Dieux d’Afrique”: “ Vi em Salvador, em um terreiro de candomblé, uma árvore cujas raízes atravessavam o oceano e chegavam às terras africanas. Através  dessas raízes, as almas dos negros brasileiros vão encontrar, após a morte, as moradas das almas ancestrais e, também através dessas raízes, divindades africanas convidadas pelo sangue dos sacrifícios, pelos toques dos tambores, vêm cavalgar em seus cavalos brasileiros.” 

André Jolly – 23/10/2009